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Dr. Rafael Oliveira
Especialista em Neurocirurgia e Cirurgia de Coluna Vertebral
ESCLEROSE MÚLTIPLA (EM)
O que é esclerose múltipla?
Para um melhor entendimento sobre do que se trata tal patologia acho fundamental entender como é um neurônio. Essa pequena estrutura, responsável pela transmissão elétrica do cérebro, é formada por um corpo e uma "cauda". Essa cauda é totalmente revestida por um tipo de isolante elétrico, tal qual, a conhecida fita isolante preta, largamente empregada em nossas casas. No corpo humano, recebe o nome de bainha de mielina. Se essa estrutura não encontra-se em perfeitas condições, o funcionamento neuronal passa a ser altamente prejudicado.
A Esclerose MĂșltipla (EM) representa a desmielinização de regiĂ”es do encĂ©falo e da medula. Portanto, ocorre uma destruição da bainha de mielina, expondo partes importantes do neurĂŽnio e afetando, diretamente, suas funçÔes.
Qualquer tecido do corpo humano, ao ser lesado, sofre processo de cicatrização. E, na EM nĂŁo Ă© diferente. A bainha de mielina, ao ser danificada, sofre deposição de diversos elementos na tentativa de cicatrizĂĄ-la. Assim, formam-se as conhecidas "placas". E essas ficam incrustadas dentro do tecido nervoso normal. Dentro de cada placa, a mielina estĂĄ ligada a macrĂłfagos inflamatĂłrios e anticorpos. Considerada uma doença auto-imune, ou seja o prĂłprio organismo cria uma reação inflamatĂłria a suas cĂ©lulas, Ă© mais comum em mulheres. E, como jĂĄ foi dito, as regiĂ”es que tĂȘm a bainha de mielina afetada, perdem a efetividade de suas funçÔes.
Clínica e diagnóstico da esclerose múltipla
A Esclerose MĂșltipla pode apresentar-se de diversas maneiras. Pode ser aguda ou insidiosa e ter uma sintomatologia mais leve ou exuberante. Geralmente, inicia com alteração de sensibilidade ou força em alguma parte do corpo ou com dĂ©ficits visuais. O sintoma inicial mais comum Ă© a parestesia, termo tĂ©cnico para formigamento. E a perda visual unilateral Ă© o segundo mais frequente. Essa dificuldade para enxergar Ă© conhecida por neurite Ăłptica. AlĂ©m dessas manifestaçÔes diversos outros sintomas podem ser observados como : visĂŁo dupla, tremores, vertigem, dificuldade de fala e deglutição, alteraçÔes de marcha, espasmos e fadiga. O diagnĂłstico pode ser confirmado atravĂ©s da ressonĂąncia magnĂ©tica. Essa evidencia as famosas placas. A anĂĄlise do lĂquor Ă© solicitado quando se tem forte suspeita diagnĂłstica e o exame de imagem Ă© normal. Ele, geralmente, mostra alteração nas bandas oligoclonais.
Observe a ressonĂąncia de encĂ©falo. Os cĂrculos em vermelho evidenciam as placas geradas pela EM.
Quais os tipos de Esclerose Múltipla?
1) Esclerose MĂșltipla em Surto RemissĂŁo - Os sintomas caracterĂsticos iniciam, sinalizando a formação de uma placa em determinada regiĂŁo do cĂ©rebro. Esse momento Ă© definido como "surto". Gradualmente, os pacientes vĂŁo se recuperando da crise com a resolução do processo inflamatĂłrio. E, geralmente, nĂŁo se evidenciam dĂ©ficits posteriores. Esse momento Ă© definido como "remissĂŁo". Tais episĂłdios podem ocorrer diversas vezes, de tempos em tempos. Esse tipo Ă© o mais comum ocorrendo em 85 a 90% dos casos.
2) Esclerose MĂșltipla Secundariamente Progressiva - O processo sintomatolĂłgico ocorre praticamente igual ao do tipo surto-remissĂŁo. Entretanto, os pacientes nĂŁo se recuperam totalmente dos dĂ©ficits, permanecendo com algum grau residual de sequela. E essas, na grande maioria das vezes, progridem com o tempo. Aproximadamente 85% dos pacientes com o tipo surto-remissĂŁo, em algum momento, vĂŁo desenvolver a forma secundariamente progressiva.
3) Esclerose MĂșltipla Progressiva PrimĂĄria - Nesse tipo nĂŁo sĂŁo vistos os surtos-remissĂ”es. A doença se dĂĄ de forma progressiva, gerando dĂ©ficits cumulativos e permanentes.
4) SĂndrome Clinicamente Isolada - O paciente apresenta somente um episĂłdio sintomatolĂłgico. Isso quer dizer que Ă© uma situação isolada sem ocorrer novamente, como nos surtos-remissĂ”es.
Qual é o tratamento para esclerose múltipla?
A EM é uma doença sem cura e todos os tratamentos diponíveis hoje em dia reduzem, parcialmente, os sintomas e a incapacidade. Existem terapias que visam alterar o curso da doença, retardando seus efeitos mais danosos.
* Imunomoduladores - O protótipo desse grupo é o betainterferon. Esse nada mais é que um citocina secretada por células imunológicas. Atua reduzindo o índice de remissões e o acúmulo de novas lesões. Cuidado com a função hepática durante seu uso. Outro fármaco aqui catalogado é o glatiramer. É um copolímero sintético que atua diminuindo as remissões e novas alterações na ressonância de encéfalo. Ambas as drogas podem ser instituídas como primeira opção, servindo também de alternativa para a outra. O tempo de tratamento é indefinido.
* Corticóides - Fármacos de primeira linha durante as recidivas. Eles reduzem os sintomas e o tempo de recuperação. São administrados em pulsos de 3 a 5 dias. Os mais comumente usados são a metilprednisolona (1 a 2 g/dia) ou dexametasona (2mg/kg/dia). Devido a possibilidade de efeito rebote, alguns profissionais prescrevem, com redução gradual, prednisona oral após a alta. Pode-se, também, associar medicamentos sintomáticos para dor, espasticidade e disfunções vesicais e intestinais.
* Outros Tratamentos - Novas drogas estão surgindo para atuar na atividade inflamatória da EM. O rituximabe, o ocrelizumabe e o natalizumabe são anticorpos monoclonais usados em surto-remissão e primária progressiva. O segundo foi retirado de mercado por gerar leucoencefalopatia multifocal progressiva. Uma nova alternativa para tal patologia é o fingolimode. Atualmente, alguns especialistas têm prescrito terapias embasadas em suplementação com vitamina D.
Caso permaneça com alguma dúvida marque já sua consulta.
Manejo Terapêutico
Em vista da grande complexidade em manejar-se pacientes com esclerose múltipla, foi criado um Protocolo Clínico e Diretriz Terapêutica pela Portaria número 391 de 05 de maio de 2015, sendo esse revisado em 2018. Essa passa informações claras e objetivas sobre a terapêutica dessa patologia. Inicia-se o tratamento com beta-interferon ou com glatiramer. A primeira opção é a mais aconselhada. Caso a droga inicial falhe, se troca para a segunda. A grosso modo, se a terapia foi iniciada com beta-interferon e esse não funcionou troca-se para glatiramer, ou vice versa. Caso esse esquema não surta efeito, institui-se o natalizumabe. Esse está contra indicado se existe alergia a sua composição ou se já foi utilizado algum imunossupresor previamente. O fingolimode está indicado se ocorreu falha terapêutica ao beta-interferon, ao glatiramer e existe incapacidade ao uso de natalizumabe. Sugere-se desse modo porque, mesmo sendo um fármaco promissor, não foi testado analisando juntamente todos os medicamentos disponíveis para a doença e há ausência de dados que superem a incerteza quanto aos riscos para seu uso. A troca medicamentosa é feita quando existe falha terapêutica (dois ou mais surtos em 12 meses) ou efeitos adversos intoleráveis. Embora trata-se de uma sistemática clara, existem indícios que sugerem possibilidades diferentes e não menos eficazes.
Rafael Oliveira - MĂ©dico NeurocirurgiĂŁo e Cirurgia de Coluna
Porto Alegre - RS